INTRODUÇÃO
As chamadas rigidez
de decorticação e rigidez de descerebração são posturas patológicas que surgem
em lesões do Sistema Nervoso Central (SNC). Essas posturas são caracterizadas
por movimentos estereotipados dos braços e das pernas que ocorrem
espontaneamente ou em função de estímulos sensoriais. A flexão de cotovelos e
punhos e a supinação dos antebraços caracterizam a postura de decorticação
enquanto que a extensão de cotovelos e punhos com supinação caracterizam a postura
de descerebração.
Qual
a importância da identificação das posturas de Decorticação e Descerebração
para o(a) fisioterapeuta ?
Ao atender pacientes que exibem essas posturas
patológicas, nós fisioterapeutas devemos estar atentos principalmente a
etiologia da lesão neurológica. Pois se a causa envolver hipertensão intracraniana
é preciso reconhecer o surgimento de sinais sugestivos de aumento da pressão
intracraniana tais como bradicardia, aumento da pressão arterial e alterações
do ritmo respiratório (tríade de Cushing).
Além disso, uma boa
avaliação inicial irá lhe fornecer informações que lhe serão bastante úteis
para identificar mudanças evolutivas do paciente. Assim, sugiro atenção
especial para o registro em prontuário da Escala de Coma de Glasgow, anotar o
local de eventuais úlceras de decúbito, do arco de movimento passivo e comportamento
do paciente durante a mobilização (abertura de olhos, verbalização, sinais de
dor, acentuação da hipertonia, etc.). Se o paciente for incapaz de interagir
fisicamente, mesmo assim, considere comunicação alternativa por meio do contato
visual. Existem várias causas que justificam o surgimento dessas posturas. Na tabela
abaixo listei algumas delas.
Também é importante monitorar se ao longo do tempo o
paciente “trocou” de posturas, ou seja: se o paciente que num primeiro momento
se mantinha na postura de decorticação e posteriormente a substitui pela postura de descerebração. Esse tipo de informação é altamente
relevante pois veremos a seguir que a transição de uma postura de decorticação
para uma de descerebração indica um agravamento do quadro neurológico, enquanto
que a transição contrária pode indicar uma melhora.
CORRELAÇÃO
ANATÔMICA
Já vimos que as posturas de descerebração e
decorticação surgem em pacientes com lesões neurológicas graves, mas quais
fatores determinam o surgimento de cada postura em particular? Antes de responder a essa
pergunta, é preciso esclarecer que por se tratar de uma resposta motora
anormal, esta análise diz respeito apenas as vias motoras. Portanto, eu
evitarei discutir um eventual comprometimento simultâneo de áreas responsáveis
pelo estado de alerta, cognição, sensibilidade ou outras funções.
Diversos textos pesquisados referem que as posturas
de decorticação e descerebração surgem após lesões das vias motoras em regiões
profundas do encéfalo. Isso significa que são lesões que afetam as vias motoras
em regiões subcorticais e no tronco encefálico.
Na literatura pesquisada, o núcleo Rubro (localizado
no mesencéfalo) é frequentemente citado como uma estrutura de referência que
ajuda a determinar o local onde ocorreu a lesão. Em termos simples: Se a lesão
afetou as vias motoras entre o córtex e o núcleo rubro, teremos a postura de
decorticação. Caso as vias motoras tenham sido lesionadas após passarem pelo
núcleo rubro, então teremos a postura de descerebração (Veja ilustração abaixo).
O núcleo rubro recebe este nome pois in vivo é
avermelhado devido a intensa vascularização e presença de pigmentos de ferro no
citoplasma dos seus neurónios. Essa estrutura, localizada no mesencéfalo, está
relacionado com movimentos automatizados e voluntários. As suas fibras
aferentes têm origem no córtex cerebral (áreas motora e pré-motora) e cerebelo
(núcleos dentado, globoso e emboliforme). As suas fibras eferentes projetam-se
para a medula espinhal, cerebelo, formação reticular, complexo olivar inferior e
área pré-tectal (para maiores detalhes sobre o núcleo rubro, recomendo a
leitura do artigo “The Red Nucleus: Past, Present, and Future”.
Decorticação:
No caso de lesões entre o córtex
e o núcleo rubro, ocorre a perda das influências corticais inibitórias sobre
tronco e a medula. É importante destacar que o núcleo rubro possui uma forte
influência na flexão dos membros superiores. Para ser mais preciso, a flexão do
membro superior é explicada pela liberação do trato rubro-espinhal (flexão dos
músculos do membro superior). Na postura de decorticação, o trato
rubro-espinhal encontra-se íntegro apesar de ter perdido a conexão com as vias
ativadoras do córtex. Embora não seja uma postura com boa correlação topográfica,
geralmente indica lesões acima do tronco encefálico (incluindo córtex cerebral,
cápsula interna e tálamo). Como mencionado anteriormente, a postura de
decorticação consiste na flexão dos braços, pulsos e dedos com adução na
extremidade superior e extensão, rotação interna e flexão plantar na
extremidade inferior. Esse padrão pode se manifestar unilateral, como no caso
de um AVE, ou bilateralmente, como no
caso de um TCE.
Como mencionado anteriormente, muito embora seja um sinal que indica uma lesão encefálica grave, a postura de decorticação sugere um prognóstico
mais favorável do que a postura de descerebração
Descerebração:
A Rigidez de descerebração ocorre
em lesões do tronco encefálico e consiste na extensão, adução e rotação
interna, dos membros superiores e extensão dos membros inferiores. Mais
especificamente, este padrão motor ocorre quando a atividade do tronco
encefálico estiver diminuída nas vias distais ao núcleo rubro. Os motoneurônios
dos músculos extensores dos membros inferiores e flexores dos membros
superiores são tonicamente estimulados pelo núcleo vestibular. A remoção dos
controles inibitórios corticais sobre o tronco facilita ações extensoras dos
núcleos vestibulares. Pelo fato de representar uma lesão ainda mais profunda do
que a caracterizada pela rigidez de decorticação, pacientes em postura de
decorticação possuem um prognóstico mais restrito. Em um trabalho publicado em
1982 (sei que é velho), foi descrito que a incidência de postura ade
decorticação em pacientes com TCE foi de cerca de 40% e que a presença desta
postura aumenta as chances de óbito de 20% a 70%.
Finalmente
Espero que esta postagem do Guia do Fisioterapeuta seja útil. pretendo ainda escrever sobre a atuação de fisioterapeutas frente a pacientes com posturas neurológicas patológicas.
Hasta la vista
REFERÊNCIAS:
- Neurologia Clínica de Harrison - 3.Ed - Acessado via GoogleBooks, clique aqui neste link
- The Red Nucleus: Past, Present, and Future: http://www.neuroanatomy.org/2010/001_003.pdf.
- Coma e outros estados de consciência, Acessível neste link
- Decerebrated rigidity in humans - link
- Controle da motricidade somática - IBB - Unesp acessível no link
- Fisiologia do Sistema Nervoso Motricidade Somática I: Medula e Tronco II acessível no link